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sexta-feira, 24 de outubro de 2008

O que querem que eu faça?

Postado em Cidadania.com

Que fique aqui vertendo chavões pró-Marta ou anti-Kassab enquanto a petista e o resto do grupo político de Lula se acovardam diante da mídia?

Cobram-me engajamento na campanha de Marta Suplicy. Paralelamente, analiso o quadro político de uma perspectiva mais ampla e ao longo do tempo, e a estratégia do grupo político de Lula para enfrentar o de Serra.

Em vez de falar da campanha em São Paulo, prefiro analisar se existe razão para esse otimismo do grupo de Serra em relação a 2010 e se o grupo de Lula tem razão na estratégia que adotou para enfrentar o governador paulista.

Primeiro, temos que ter em mente um horizonte mais amplo. Um blog como este não muda nada fazendo campanha. Ainda mais quando se trata de uma campanha cuja estratégia é a de demonização do adversário, por mais que esse adversário esteja ao lado do pior da política brasileira e por representar um previsível fracasso em sua administração da maior cidade sul-americana, atirada num caos urbano que em parte nenhuma do país chega aos pés do caos paulistano.

Prefiro discutir se eventuais fracassos do grupo de Lula em Belo Horizonte, Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro e Salvador, no pior cenário que se possa imaginar, configurariam a derrota política expressiva que estão dizendo que seria.

Quantitativamente falando, em termos de coeficiente eleitoral, a parcela vitoriosa dos eleitorados dessas cidades menos a parcela derrotada produz um contingente de eleitores que pouco deve passar dos 5 milhões de pessoas num eleitorado que já passa muito da centena de milhão de eleitores.

Ao especular sobre o cenário mais sombrio de todos, ainda assim sobram motivos para relativizar uma improvável vitória completa dos conservadores no Nordeste, no Sul e no Sudeste do país. Até porque, seriam vitórias em centros urbanos densamente povoados e o excedente anti-Lula nesses centros, que permitiria tal vitória conservadora, numericamente não chega a ser representativo no conjunto do eleitorado brasileiro.

No limite, é bom lembrar que uma capital conservadora como São Paulo está presa num cinturão de grandes cidades limítrofes onde o grupo de Lula está vencendo. Além disso, o PFL e o PSDB sofreram uma expressiva redução no número de prefeituras que governam, enquanto que o PT foi o que mais ganhou. Essa redução das administrações municipais da direita, por paradoxal que seja, praticamente pôs fim ao partido de Gilberto Kassab.

A partir do ano que vem, o mal chamado Democratas não governará mais nada relevante – e até irrelevante – politicamente além de São Paulo. Um partido com um número desprezível de prefeituras perde em capilaridade e em capacidade de renovação de sua bancada federal, e isso terá reflexo na eleição do novo Congresso em 2010.

Contudo, não se pode subestimar o peso político e econômico dos governos conseguidos pela direita. Ainda mais quando se leva em conta que o grupo político de Serra controla todos os grandes meios de comunicação do país.

A capacidade dessa gente de criar escândalos envolvendo seus adversários agora ganhará o apoio de dezenas de milhões de pessoas, entre as quais estão as mais influentes e poderosas do país, sem falar que os orçamentos dos governos estaduais e municipais do grupo de Serra conferem uma “capacidade de convencimento” enorme a esse grupo.

A mídia se converteu numa arma de permanente bombardeio do grupo político de Lula. Pode criar escândalos a partir do nada na hora que queira. Inventou um dossiê contra FHC, um grampo contra Gilmar Mendes e, ontem, para desmentir a menina Nayara, o assassino Lindemberg, os vizinhos “de parede” de Eloá e os peritos, todos os que afirmam peremptoriamente que não houve tiro antes da explosão, a mídia pôs no ar imagem de anônimos com rosto e voz distorcidos que dizem que houve o tal tiro.

Enquanto isso, o PT preferiu apelar para a principal arma da direita (difamação) em São Paulo, por exemplo, em vez de levantar um debate que esvaziaria o poder da mídia de se apresentar como juíza da partida, ou seja, dizer claramente à sociedade que a mídia é atriz no processo político. Que é jogadora, não juíza.

Se fizesse isso, o grupo de Lula anularia um importante ativo da direita. Bastaria ter usado o horário eleitoral em São Paulo para carimbar nas costas da mídia a pecha de partidária da direita no Brasil. Isso se espalharia como fogo, levantaria a militância.

Mas como fazer se Lula chega a ir prestigiar eventos da Veja? Como fazer se Marta Suplicy dá de bandeja a seus adversários a oportunidade de inverter os papéis de vítima e feitor do preconceito?

Lula continua acreditando que poderá ser aceito pela elite algum dia. E subestima o poder da mídia de fazer a crise internacional entrar mais no Brasil do que deveria, através daquele tipo de profecia auto-realizável na qual infunde-se desânimo e medo nos agentes econômicos, estes se paralisam e aos próprios negócios e, assim, vai se criando, artificialmente, uma situação recessiva que acaba por provocar quebradeira e desemprego...

Onde está o presidente Lula, que, até agora, não falou nem uma vez à nação, em cadeia nacional de rádio e tevê, sobre a crise no mundo rico? Por que ele deixa a mídia difundir esse pânico como quer?

Assim fica difícil, meus amigos. Não adianta eu exortar vocês para irmos às ruas protestar – e sem que se dê qualquer repercussão ao nosso esforço – enquanto o grupo de Lula contemporiza com a direita e dá à mídia o privilégio de poder se apresentar como juíza do processo político.

Corre um boato por aí, um boato que encanta até uma parte da esquerda, de que Lula quer queimar Dilma em 2010 para ele voltar nos braços do povo em 2014. Tenho uma certa dificuldade em aceitar essa hipótese. Será que Lula seria tão burro assim?

Serra pegando um país arrumadinho em 2010 – e com blindagem de uma mídia que o próprio PT e Lula sempre prestigiaram e pouparam de críticas –, o capo paulista pode se transformar no dono do país. Faria perseguições políticas usando as instituições do Estado e a mídia, aprovaria mudanças na Constituição que, além de tudo, permitiriam que se eternizasse no poder, e tudo isso, repito, com todos os grandes meios de comunicação apoiando – tevê, rádio, grandes portais de internet, jornais, revistas...

Em suma: o que querem que eu faça? Que fique aqui vertendo chavões pró-Marta ou anti-Kassab enquanto a petista e o resto do grupo político de Lula se acovardam diante da mídia? Melhor eu tratar de vender minhas pecinhas, porque os tempos ficarão bicudos se Lula e seu grupo não acordarem e partirem para o enfrentamento político. Se fizerem isso, estarei na linha de frente.

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